Inflexão da alma
“Não é possível viver
demasiadamente consciente, demasiadamente pensante. Aliás, observemos a
natureza: tudo o que vive muito e contente não é inteligente. As tartarugas
vivem séculos, a água é imortal (...). Na natureza, a consciência é a exceção;
pode-se até postular que ela é um acidente, uma vez que ela não assegura nenhuma
superioridade, nenhuma longevidade particular. No quadro da evolução das espécies,
ela não é sinal de uma melhor adaptação”.
(Como me
tornei estúpido, Marin Page)
Relendo um texto que compus há poucos
dias, em que me queixava de nunca ter
encontrado mulheres intelectualizadas que eu pudesse namorar, senti-me leviano.
Por que razão, no final das contas, seria isso importante?
Pondé me desperta para uma filosofia
desprendida da arrogância e aspirações acadêmicas. Não há sentido em pretender
atingir o cume de conhecimentos, se for para nos tornarmos antipáticos ou
ressentidos. Afetação intelectual é tolice. Causa enfado e sentimento de
abandono. O que não significa que tenho de desistir de levar as pessoas a
pensar.
Espero chegar à idade em que eu
compreenderei, com Pondé, que a busca pelo reconhecimento acadêmico e prestígios
intelectual e profissional é vã ou desimportante. Mas até lá preciso empreendê-la,
mesmo que seja para me frustrar. Preciso evitar o fracasso para experimentar,
futuramente, a frustração e o tédio.
“Cansei da filosofia, por isso
comecei a escrever para não filósofos, porque a universidade, antes um lugar de
gente inteligente, se transformou num projeto contra o pensamento. Todos são
preocupados em construir um mundo melhor e suas carreiras profissionais. E como
quase todas as pessoas são feias, fracas e pobres, sem ideias e sem espírito
inquieto, nada nelas brota de grandioso, corajoso ou humilde. Eu não acredito
num mundo melhor. E não faço filosofia para melhorar o mundo. Não confio em
quem quer melhorar o mundo. É isso mesmo: acho um mundo de virtuosos
(principalmente esses virtuosos modernos que acreditam em si mesmos) um
inferno. Um bom charuto, cachimbo ou cigarro pode ser uma boa companhia na
leitura destes ensaios. Ou uma mulher gostosa do seu lado, ou um homem
charmoso. Depois do sexo – e do cigarro -, leia um desses ensaios, quem sabe a
quatro mãos.”
(p. 19)
“(...) os pequenos ensaios que
você tem em mãos foram escritos por um filósofo de carreira, que cumpriu todos
os rituais exigidos e que finalmente os recusou. Hoje, os vejo como vazios de
sentido Alguém que passou pela faculdade de medicina, trabalhou como voluntário
num necrotério, formou-se em psicanálise e cada vez mais está interessado no
que pessoas comuns perguntam (...), e cada vez menos interessado no que a
universidade quer. E o que ela quer? Como comecei a dizer acima, ela quer
burocratas medíocres que se escondam atrás de grandes teorias para não
confessar sua insegurança diante da temida falta de sentido da vida e de sua
matéria concreta, o envelhecimento. Não controlamos a vida. Grandes planos
podem dar em nada, ter fé pode levar você ao fracasso, acreditar em si mesmo
pode levá-lo a erros definitivos, escolher ficar rico pode ou não dar certo,
ter muito dinheiro pode sim garantir pessoas ao seu redor amando-o (Nelson
Rodrigues dizia que dinheiro só compra amor verdadeiro...) ou pode levá-lo à
solidão – enfim, não há garantias. É por isso que o normal é ser inseguro,
mentiroso, covarde, e não santo ou corajoso.”.
(p. 21)
(Contra
um mundo melhor, Luis Felipe Pondé)
Eu acho que os professores de português
deveriam reconhecer o papel fundamental que podem desempenhar na formação
cultural ampla dos estudantes; é ele a autoridade competente a quem se destina
a formação de leitores. Mas, para formar leitores, os professores de português precisam ser leitores. Trabalhando a
leitura, o professor de português pode transitar por várias áreas do saber
humano. Por isso, espera-se dele também uma formação cultural ampla. A
possibilidade de explorar junto aos alunos, no ensino da leitura, diversas temáticas
em variadas áreas do saber humano, deve ser encarada como um mérito. No
entanto, muitos de nossos professores de português ainda insistem em ensinar análises
gramaticais pura e simplesmente. Não se dão conta de que, pela leitura, podem
se apoderar de um repertório de conhecimentos que tornarão seu trabalho como
formador de leitores muito mais eficiente.
Tal é um fato que me desagrada e, em
minha prática pedagógica, esforço-me por não me acomodar. Mas a frustração é
inevitável, por vezes.
Todo educador deve ter essa exigência mínima em sua profissão, que é conseguir estimular, alimentar no aluno essa vontade de “saber” compreenda-se: “ler, escrever, interpretar”, e as regras gramaticais vêm como bônus nesse universo do aprender. Veja que não estou dizendo que elas são secundárias, elas são importantes sim. Veja o exemplo dos seus textos, além do embasamento teórico, a estética da linguagem é um grande contributivo para prender o leitor.
ResponderExcluirBjusss!
Ps. Leviano, prepotente, afetado, nunca. Em meio a tanta superficialidade, que as pessoas alimentam a mente diariamente, estimular que se pense não é ofensa a ninguém.