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segunda-feira, 11 de outubro de 2021

"Brahman é aquilo por meio do qual vivemos e agimos, a espontaneidade fundamental de nossa natureza". (Zimmer)

 





A Vontade e Brahman: Schopenhauer descobre os Vedas

 

             Maya, em sânscrito, tem o significado original de “poder criativo-mágico” do Divino. Através deste poder (Maya), Deus se torna o mundo, e o mundo, no final, se torna Deus. Deus encena uma peça, chamada “lila”, e o mundo é o grande palco onde acontece essa peça divina. Brahman, a realidade última, é, assim, um grande mago que se transforma no mundo. A palavra “Maya”, de “poder criativo mágico” passou a significar, com o tempo, o estado psicológico de um ser humano sob o feitiço ou encantamento da peça mágica. A ilusão de Maya é o estado em que nos encontramos cotidianamente quando tomamos os acontecimentos, os eventos do mundo como existindo objetiva e independentemente de nós. Estamos presos no feitiço de Maya quando tomamos o nosso “eu” como distinto do “mundo”. Sob o feitiço de Maya, ignoramos que Brahman, a realidade última e Atman, a nossa alma individual, a fonte última e mantenedora de todos os seres, é Um, formam uma Unidade: “Tu és isso”. É o que nos dirá também Schopenhauer: meu corpo e meu pequeno “eu” não são mais do que a manifestação (aparência) de uma mesma Vontade da qual o mundo é um espelho, tal como Brahman é o próprio mundo no seu jogo transformístico. O ensinamento básico dos Vedas é que as coisas e os eventos fenomênicos são manifestações de uma mesma realidade última (Brahman). Quando Schopenhauer diz que sua doutrina expressa, em linguagem racional, a essência da sabedoria Védica, ele está afirmando que sua doutrina ensina o que ensina basicamente o hinduísmo: toda ordem fenomênica é objetivação de uma única e mesma Vontade, todos os seres existentes são manifestações de uma única e mesma Vontade. Mas Schopenhauer não chega a assumir todas as consequências de sua apropriação da metafísica religiosa hindu. A Vontade, que Schopenhauer diz ser a essência do mundo, não chega a se identificar totalmente com Brahman, já que Brahman, embora onipresente, é o Divino que se transforma no mundo, é uma espécie de mago dotado de um poder criativo e mágico (maya); o mundo é criação do poder mágico do Divino, mas Schopenhauer insiste em que a Vontade não é a causa eficiente do mundo, o que não nos impede de ver nela um pouco das qualidades místicas de Brahman, já que, tal como Brahman é Atman quando se expressa na forma da alma humana, a Vontade também se objetiva em cada fenômeno, em cada ser do mundo orgânico e inorgânico. As aproximações da filosofia de Schopenhauer com a escola Vedanta, que se baseia nos Upanishads, não devem, portanto, ser substimadas. Os hindus ensinam “moksha”, a experiência de libertação do encantamento de Maya, assim como Schopenhauer ensina a “negação da vontade” como o caminho de libertação última da tirania da vontade, do desejo, que nos faz querer viver a vida mesma tal como se nos apresenta submetida ao encanto de Maya, identificado por ele com o “principium individuationis”. A metafísica da Vontade em Schopenhauer não pretende ser uma explicação da causa primeira do mundo. A filosofia, para ele, não deve se ocupar com o “de onde veio o mundo” nem com o “para que existe”, mas apenas com “o que é o mundo”. Sua metafísica busca compreender no mundo o fundamento mesmo desse mundo. A metafísica, segundo Schopenhauer, não é apenas uma interpretação, mas é, sobretudo, uma decifração. Decifrar o enigma do mundo é compreender a coisa-em-si, a saber, a Vontade, cuja natureza é metafísica.