Sobre viver e tempo
Tu me fizeste crer ser possível e me furtaste o
possível pelo temor ao futuro. Tenho ódio a mim por minha teimosia na expressão
de palavras promitentes. Não compreendes que a forma da vida é o presente, que
o futuro e o passado só existem como noções para a consciência? Não há futuro,
não há passado. O real é o próprio presente. Ao se ocupar do que foi e ao se
preocupar com o que ainda não é, atormentas-te com nada, pois nenhum homem vive
no passado ou no futuro. Ao proibir-se o presente, proíbe-se tudo.
Risíveis são os homens preocupados com o
futuro, pois não se dão conta de que o que chamam de futuro é mera projeção de
acontecimentos, que não são, na imaginação. Esses acontecimentos futuros não
existem. O passado não é mais; o futuro ainda não é. Passado e futuro são dois nomes para o não-ser. Não habitamos nem o passado,
nem o futuro. Sou no presente e o destinar-se da vida é o presente sempre
estável, inabalável. Falo de amanhã, mas enquanto falo, estou no presente, sou
no presente. E quando penso - chegou o
amanhã -, já é presente.
Lição schopenhaueriana: “jamais homem
algum viveu no seu passado, nem viverá no seu futuro: é só o presente que é a
forma de toda a vida. O presente existe sempre, ele e aquilo que ele contém”.
Passado e futuro são meras noções, fantasmas, homem tolo! Noções que, em teu espírito, se formam, que te impedem de viver no kairós (o tempo oportuno).
Os gregos chamavam kairós ao instante propício, àquela parcela de tempo durante a qual
devemos aproveitar o que é preciso aproveitar. O hedonismo é celebração do
presente e indiferença ao passado e ao futuro. Pretender buscar em outra parte,
que não nesta dimensão pontual do tempo, as alegrias, é um erro. Homem tolo! Ao
desejar ser feliz, nunca é feliz! O
essencial para um grego como Aristipo era fruir o instante, era pedir ao
presente o que ele pode dar e nada mais. A experiência do kairós é única:
trata-se de apanhar o que deve ser apanhado, nem antes, porque cedo demais, nem
depois, porque tarde demais.
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