Fastio
Tempo.
Um intervalo para descansar. Ou não, porque cá estou eu a escrever (pareço um
português!). E escrever por quê? Para quê? Simplesmente, porque preciso
comunicar e aqui neste quarto em que permaneço a maior parte do dia não há um
interlocutor sequer. E para que leiam o que pretendo comunicar. Os livros
substituíram os brinquedos. Eu me entretenho com eles. Compro-os em penca.
Talvez, eu precise de um tratamento psiquiátrico ou psicológico. Tanto faz.
Mas, pensando bem, as pessoas que apresentam compulsão por comprar acabam adquirindo
produtos que não usam. Compram o supérfluo. Mas eu não, eu compro livros que
leio. E a maior parte do tempo do meu cotidiano é preenchida pela leitura.
Leitura variada. Linguística, sociologia, filosofia, teologia, psicologia,
psicanálise... a quase tudo me atrevo. Nem sempre tudo compreendo bem. E muito
continuo sem entender. E me debato com questões para as quais as respostas são
muitas e nenhuma é definitiva. Assim, é o exercício de filosofar. Fazer as
perguntas certas importa mais que procurar as repostas. Não que estas não
importem também.
Muitas
vezes, no entanto, recai sobre mim o enfado e o desalento. Pergunto-me pelo
propósito de tanta leitura. Para que pretender saber tanto? Saber mais tem a
desvantagem de impedir que as pessoas em geral nos acompanhem. E precisamos
tomar cuidado, como bem me disseram duas amigas, para que não afugentemos as
pessoas cuja percepção de mundo seja um pouco mais estreita ou domesticada pelo
senso-comum. Nada contra o senso-comum, que, afinal, constitui o conjunto de
crenças e saberes na base do qual formamos nossos pensamentos e atuamos no
dia-a-dia. Mesmo os mais brilhantes intelectuais se valem do senso-comum em seu
viver cotidiano. Não há como escapar a ele. Mas é preciso superá-lo, se
quisermos alcançar uma compreensão mais totalizante, profunda e verdadeira do
mundo. O senso-comum nos conserva no domínio superficial da realidade; é uma
forma de compreensão do mundo assistemática. Nele, se acham opiniões, crenças e
hábitos que se vão cristalizando por força de nossa socialização. Opiniões,
ensinou Platão, se ligam ao domínio das aparências. Estão sujeitas ao erro, à
ilusão. Dispensam o exame crítico e não se fundam em justificativas teóricas.
Ler nos
permite ir além do senso-comum. Por isso, a religião também se me tornou
insustentável. Mas eu não sou um ateu a quem basta vociferar meia dúzia de
palavras infensas à fé. Sou antes um estudioso de religião e de teologia. Mas
não um especialista. Esse título me garantem os estudos que venho empreendendo
há, pelo menos 8 anos, na área de Linguística. Unir o estudo da linguagem com o
estudo da filosofia trouxe, certamente, um engrandecimento intelectual,
espiritual e humano.
Mas eu
me preocupava há pouco com o desânimo que experimento quando me dou conta de
que minha dedicação à leitura me parece um pouco despropositada. É que (pelo
menos é assim comigo) quando aprendemos queremos comunicar o que aprendemos,
queremos compartilhar e ensinar. Quase todo professor experimenta a frustração
quando, diante de uma turma, se dá conta de que muitos não se interessam em
aprender nada.
Meu
desânimo, no entanto, tem também outra origem. Ele me enfraquece sempre que me
dou conta de que certas opiniões e crenças são tão empedernidas, que desarraigá-las
se torna tarefa de Sísifo. Um exemplo disso é a persistência de crenças tais
como “brasileiro não sabe português”, “português é difícil”, “o povo fala tudo
errado” e por aí vai. É claro que para combater o preconceito linguístico
formam-se professores devidamente competentes nos estudos (socio)linguísticos. Mas
o trabalho desses professores é árduo, pois que precisam lidar com uma tradição
de ensino normativo de língua ainda bastante marcante e resistente em nossa
cultura. Cada nova turma em que lecionará terá de refazer seu trabalho. Provavelmente,
essa turma se constituirá de alunos que aprenderam com seus professores de
português anteriores uma série de lições fundadas em crenças equivocadas sobre
a língua. E eles reproduzirão essas crenças.
Certo.
Eu aceitei o desafio quando decidi cursar Letras. E eu aceitei existir
contrariamente à maré do conformismo quando abri aquele primeiro livro. É a
vida!
Ola Bruno,
ResponderExcluirE como foi bom vc aceitar tais desafios pois assim pessoas como eu podem através da leitura de seu blog, refletir sobre os caminhos, sobre as crenças e os conhecimentos. Como disse o grande poeta " Tudo vale a pena..." se a alma não é pequena e a mente também não é mesmo?
Se os livros preenchem de prazer e satisfação seus momentos de solitude, então quem sabe, vc não encontrou o grande elixir da vida?? Se os mesmos livros fazem com que busquemos mais respostas para tantas perguntas, não serão eles nossos maiores mestres? Viver no mundo dos livros é realmente um prazer para poucos...
Eu ainda conto, não a meu favor, com meu lado racional, por conta da matemática no meu sangue desde menina...minhas perguntas não podem ter varias respostas ainda...elas precisam ser exatas..e esse é um caminho difícil que preciso e muito modificar, espero um dia conseguir..
Parece-me as vezes tao tolo pensar que não ha um pq para alguns acontecimentos e isso fica sem deglutição...
Um dia, cada um de nos em seus caminhos, por vezes tortuosos chegaremos ao aprendizado daquilo que tanto nos aflige??
O que sei é que gosto muito de ler o que vc escreve e não o faço se não estou com tempo disponível, pq preciso dessa dedicação, para pensar..refletir e quem sabe aprender um pouco com vc!
É sempre um prazer enorme ler "seus escritos", Bruno... parabéns!
Um beijo com muito carinho,
Rose