sábado, 28 de janeiro de 2012

"Só se aprende a ler lendo cada vez mais" (BAR).

                                
                                                 Um convite à leitura       

                                                 A elegância do conteúdo

De ferramentas tecnológicas, qualquer um pode dispor, mas a cereja do bolo se chama conteúdo. É o que todos buscam freneticamente: vossa majestade o conteúdo.
Mas onde ele se esconde?
Dentro das pessoas. De algumas delas.
Fico me perguntando como é que vai ser daqui a um tempo, caso não se mantenha o já parco vínculo familiar com a literatura, caso não se dê mais valor a uma educação cultural, caso todos sigam se comunicando com abreviaturas e sem conseguir concluir um raciocínio. De geração para geração, diminui-se o acesso ao conhecimento histórico, artístico e filosófico. A overdose de informação faz parecer que sabemos tudo, o que é uma ilusão, sabemos muito pouco, e nossos filhos saberão menos ainda. Quem irá optar por ser professor não tendo local decente para trabalhar, nem salário condizente com o ofício, nem respeito suficiente por parte dos alunos? Os minimamente qualificados irão ganhar a vida de outra forma que não numa sala de aula. E sem uma orientação pedagógica de nível e sem informação de categoria, que realmente embase a formação de um ser humano, só o que restará é a vulgaridade e a superficialidade, que já reinam, aliás.
Sei que é uma visão catastrofista e que sempre haverá uma elite intelectual, mas o que deveríamos buscar é justamente a ampliação dessa elite para uma maioria intelectual. A palavra assusta, mas entenda-se como intelectual a atividade pensante, apenas isso, sem rebuscamento.
O fato é que nos tornamos uma sociedade muito irresponsável, que está falhando na transmissão de elegância. Pensar é elegante, ter conhecimento é elegante, ler é elegante, e essa elegância deveria estar ao alcance de qualquer pessoa. Outro dia, conversava com uma taxista que tinha uma ideia muito clara dos problemas do país, e que falava sobre isso num português correto e sem se valer de palavrões ou comentários grosseiros, e sim com argumentos e com tranquilidade, sem querer convencer a mim nem a ninguém sobre o que pensava. (...)
(Marta Medeiros – Revista O Globo, 06/06/2010)

Qualquer estudante de Letras formado hoje em nossas universidades pode contar com uma gama vasta de estudos orientados para a compreensão da forma e funcionamento do texto, dos processos de discursivização (actorialização, temporalização e espacialização), das estratégias linguístico-cognitivas de que se vale o leitor para interpretar e compreender um texto durante a atividade de leitura. Ele poderá valer-se de teorias de orientação pragmática, cognitivista, sociocognitiva-interacionista que se situam no domínio recoberto pela designação Linguística Textual, a fim de que sua prática pedagógica tome o texto para unidade de reflexão e estudo.
Essas teorias o instrumentalizarão para que possa fomentar atividades que envolvam os alunos na prática de leitura e compreensão das tramas do texto. Decerto, o estudante, então professor, que se familiarize com tais teorias, se aperceberá da complexidade de um texto, enquanto objeto teórico. Para os fins desta exposição, refiro-me ao texto tomado em sua modalidade escrita, embora toda e qualquer unidade de comunicação, independentemente de sua extensão, complexidade e modalidade (oral ou escrita), seja um texto. Assim é que uma interjeição como “Oba!”, se pronunciada num dado contexto, por um falante após receber uma notícia que o entusiasmou, será um texto.
O estudante perceberá que o conceito de texto passou por mudanças, segundo as diferentes teorias que se produziram em torno dele. O conceito de texto varia segundo os pressupostos teóricos que orientam a análise. Numa perspectiva formalista, o texto é a frase complexa, a unidade mais alta na hierarquia gramatical. Do ponto de vista da semiótica, é um signo complexo. E as concepções variarão até chegarmos à concepção de base sociocognitivo-interacionista, segundo a qual o texto é lugar de interação entre atores sociais e de construção interacional de sentidos (Koch, 2004: XII).
Na sua fase inicial, a Linguística Textual ambicionava construir uma gramática do texto, visto que suas preocupações repousavam nos mecanismos de construção textual. Os estudiosos desse período queriam compreender o que faz de um conjunto complexo de frases um texto. Passaram a falar de textualidade, ou seja, a qualidade que define um texto como texto. Essa textualidade aponta para uma trama, uma teia de relações entre as partes constitutivas. Com a virada pragmática, o contexto é incorporado ao escopo das preocupações dos linguistas que se dedicavam a estudos nessa área. O texto deixa de ser entendido como um objeto autônomo, para ser estudado do ponto de vista de seu funcionamento em eventos comunicativos reais. Essa visão pragmática ressaltava as noções de ação e atividade, daí seu postulado segundo o qual os textos são produtos de ações verbais (ou verbalizáveis) complexas, na base de um projeto de dizer de um falante. Ele têm uma intenção e a materializa ao produzir seus textos. Toda ação verbal é ação social, portanto ação determinada por regras sociais.
Uma nova virada viria a ocorrer, na década de 80 – a virada cognitivista. Observou-se, pois, que toda ação (social ou verbal) é acompanhada de processos cognitivos que se dão no cérebro/mente das pessoas. Estas mobilizam conjuntos complexos de conhecimentos armazenados em sua memória ao realizar tarefas. Esses conjuntos complexos de conhecimentos foram chamados de modelos cognitivos. O texto passou a ser encarado como resultado de processos mentais.
No interior da corrente cognitivista, a partir da observação de que processos cognitivos não se dão apenas no interior da mente de pessoas, tendo o ambiente apenas a função de estimulação, surge a perspectiva sociocognitivo-interacionista e com ela a concepção de que muitos de nossos processos cognitivos ocorrem no âmbito social e resultam da cooperação entre atores sociais. A cognição é, assim, resultado de nossas ações e de nossas capacidades sensório-motoras. Os conceitos emergem das atividades nas quais o organismo ou o corpo se envolve.
Nessa perspectiva, a língua é atividade intersubjetiva, resulta de ações conjuntas. Koch, em Introdução à Linguística Textual (2004), nos ensina:

“Dentro desta perspectiva, as ações verbais são ações conjuntas, já que usar a linguagem é sempre engajar-se em alguma ação em que ela é o próprio lugar onde a ação acontece, necessariamente em coordenação com os outros. Essas ações não são simples realizações autônomas de sujeitos livres e iguais. São ações que se desenrolam em contextos sociais, com finalidades sociais e com papéis distribuídos socialmente”
(pp. 31-32)

O estudante de Letras, então professor, poderá contar também com as contribuições de outra corrente de estudos que, fazendo eco aos estudos de Bakhtin sobre dialogismo, polifonia, ideologia, discurso, encontrará repercussão entre nós pela vertente francesa: é a chamada Análise do Discurso. Trata-se de um campo que, desde seu surgimento, se propôs transdisciplinar, visto que incorpora em seu escopo de análise a História, podendo assim inscrever-se tanto na Linguística quanto no político. As noções de sujeito, formação discursiva, o reconhecimento da inter-relação entre linguagem e exterioridade possibilitam à análise do discurso o diálogo com a Psicanálise, com materialismo histórico, que compreende um conjunto de teorias, de inspiração marxista, que se ocupam da formação e transformação sociais (a História), e com a Linguística (donde surgirá uma teoria do discurso). Convém, no entanto, salientar que a língua, nessa perspectiva, não é tomada como objeto abstrato, mas vista na sua relação constitutiva com a exterioridade – a História. Interessa aqui a determinação histórica dos processos semânticos. O discurso é tomado como um acontecimento sócio-histórico de produção de sentidos.
Para o estudante de Letras, recém-egresso da universidade, a análise do discurso, provavelmente, lhe parecerá um terreno espinhoso e obscuro, já que sua compreensão depende de uma série de rupturas e de uma capacidade maior de fazer abstrações. E eu não estou sugerindo a possibilidade de transpor diretamente as concepções da análise do discurso para a prática de ensino de leitura na escola. Longe disso. Quero apenas dizer que, munido dos conhecimentos trazidos pela análise do discurso sobre linguagem, texto, discurso e a relação destes com a exterioridade constitutiva (já que não se concebe a separação entre o interior e o exterior, ao contrário, a exterioridade se inscreve no interior do discurso), o professor poderá preparar planos de leitura que enriqueçam a visão que os estudantes tem não só sobre a atividade de leitura, bem como sobre a natureza do texto. Eles poderão ser estimulados a “ler para além dos caracteres impressos no papel”. Vejamos, abaixo, alguns postulados que, uma vez conhecidos, ajudarão o professor na árdua mas não menos estimulante tarefa de ensinar a ler:

1p. Um texto prevê múltiplas leituras (embora não todas). E essa multiplicidade de leituras possíveis depende do acúmulo de leituras prévias do leitor e, portanto, dos conhecimentos prévios que ele já traz em sua memória. Tais conhecimentos são produto de suas experiências de mundo (incluindo-se aqui as experiências de leitura).

2p. A produção de sentidos para um texto se dá na inter-relação entre leitor-texto-autor. Durante a leitura (entendida como processo de atribuição de sentidos), o leitor mobiliza uma série de conhecimentos (modelos cognitivos) e estratégias de ordem linguístico-cognitiva (inferências, elaboração de hipóteses, testagem de hipóteses) a fim de construir um sentido para o texto. As chamadas estratégias metacognitivas, mediante as quais o leitor traça objetivos para a leitura, ajudam-no a controlar e avaliar a pertinência/ adequação dos conhecimentos na atividade mesma de produção de sentidos.

3p. Todo texto é um intertexto. Esse princípio nos diz que todo texto encerra ou evoca outros textos com os quais dialoga. As relações entre textos são várias: podem-se caracterizar por oposição, paródia, validação, podem ser do tipo implícita ou explícita, etc. A esse fenômeno chama-se intertextualidade. Pode-se falar ainda em intertextualidade intergenérica (ou seja, entre gêneros textuais).

4p. A intertextualidade que, numa perspectiva discursiva, é entendida como interdiscursividade (o fenômeno pelo qual todo discurso se constrói sobre um já-dito, todo discurso está calcado sobre outros discursos), pressupõe a existência de uma memória social ou discursiva, na base da qual os textos/ discursos podem ser recuperados.

5p. Todo texto assemelha-se a um iceberg – o que fica à tona, isto é, o que é explicitado no texto, é apenas uma pequena parte daquilo que fica submerso, ou seja, implicitado. Compete ao leitor, portanto, buscar os níveis significativos subjacentes, se quiser atingir uma compreensão satisfatória do texto.


A Análise do Discurso, uma vez adotando a concepção de sujeito socio-historicamente situado, destituirá o autor da função de senhor do sentido. Evidentemente, é ele responsável pela unidade semântica do discurso, é um produto institucional. Quem produz o discurso é, no entanto, o sujeito, sempre descentrado e interpelado pela ideologia. O sujeito tem a ilusão de ser a fonte do sentido, mas ele é caracterizado pela dispersão e sempre diz de um lugar determinado socio-historicamente. Ele se inscreve em diferentes formações discursivas e formações ideológicas e é atravessado pela heterogeneidade, pela pluralidade de vozes (polifonia) oriundas de diferentes discursos. O sujeito se insere numa conjuntura sócio-histórico-ideológica, de modo que compreendê-lo é compreender o conjunto de vozes sociais que o constituem.
Tendo em vista o exposto, proponho uma leitura para o texto de Marta Medeiros. Não tenho a intenção de mobilizar todo o instrumental teórico-metodológico da Análise do discurso ou da Linguística Textual, tarefa muito difícil, dados os limites e o propósito deste texto. Vou procurar chamar a atenção para o fenômeno do dialogismo e da argumentação, apontando aqui ou ali observações sobre a produção do sentido por meio das escolhas linguísticas operadas. Vale dizer que a noção de dialogismo, que nos remete à diálogo, consiste nas relações entre um eu e um Outro nos processos discursivos determinados historicamente. Esse eu não é o sujeito abstrato da psicanálise, mas o sujeito social determinado historicamente; assim também o Outro constituí as vozes de um mundo social no qual os sujeitos dialogam. O dialogismo implica interação entre sujeitos de discurso.

Em geral, o leitor incauto pode passar despercebido pelo título de um texto. No entanto, o título revela-se, quando não metaforizado, muito importante para que o leitor comece a formular hipóteses sobre o tema do texto. É apoiando-se no título que o leitor criará expectativas sobre o tema do texto. Senão, vejamos.
Nem sempre é possível inferir apenas do título o assunto do texto, mas a leitura das primeiras linhas do primeiro parágrafo podem já lançar alguma luz. Também importa, é claro, o quanto sabemos sobre o autor (sua formação, sua atuação social). Marta Medeiros é jornalista e escritora. Tendo em conta o que sabemos sobre o autor e o que apreendemos na leitura do primeiro parágrafo, o conteúdo a que se refere a autora não tem nada que ver com significação em linguagem, embora guarde uma relação metafórica com o ‘conteúdo de um copo’. Avançando um pouco mais na leitura, o leitor depreenderá que conteúdo diz respeito à ingrediência intelectual, à profundidade psicológica. Assim, deduzirá o leitor que uma pessoa com conteúdo é uma pessoa capaz de sustentar uma conversa intelectualmente interessante, uma pessoa capaz de se posicionar criticamente acerca de questões de relevância social, independentemente de seu grau de escolaridade.
Essa dedução deverá ser, como dissemos, testada pelo leitor. Será procedente? Plausível? A construção do sentido para o texto se dá, como disse, na interação entre leitor, texto e autor. A interpretação pelo leitor é ancorada nas pistas que o texto lhe dá. Há pistas que apontam para um dado sentido, que o asseguram; e caberá ao leitor reconhecê-las. Vejamos algumas delas.
O que reforça a compreensão que o leitor terá de uma pessoa com conteúdo? Ora, no texto, encontramos menção à importância do convívio com as produções literárias (“o já parco vínculo familiar com a literatura”), a desvalorização da educação cultural (“caso não se dê mais valor a uma educação cultural”), a importância do conhecimento nas dimensões histórico, filosófica e artística. Estas (e outras mais) constituem “pistas” nas quais o leitor se apóia para validar suas hipóteses e empreender sua leitura.
O trabalho interpretativo é um processo sociognitivo-interacional, durante o qual o leitor vai “garimpando” o texto, desvendando-lhe os implícitos, os silenciamentos e buscando “ouvir” as outras vozes que falam através da voz do sujeito do discurso, sempre disperso e descentrado.
O leitor experiente é aquele capaz de apreender as camadas de significação subjacente à superfície textual. Ele não se apega a literalidade das palavras, não fica preso à superfície do texto, mas vai à caça dos implícitos.
Voltando ao título. Vale notar que a palavra elegância, transposta do domínio semântico do vestuário (dizemos de uma pessoa bem vestida que é uma pessoa elegante), para o campo semântico da ‘intelectualidade’, já aponta para um conflito: rejeita-se a futilidade típica do domínio da moda, subverte a ideologia da valorização da aparência, da beleza, ao empregar ‘elegância’ para qualificar a ‘atitude intelectual’ ou ‘atitude crítico-reflexiva’. O que nos diz o sujeito do discurso é: “pode-se ser elegante exibindo uma consciência crítico-reflexiva”; “pode-se ser elegante sendo capaz de sustentar uma conversa sobre temas de relevância sócio-política e cultural”.
Note-se que ao demonstrar insatisfação em relação ao desinteresse generalizado, em nossa sociedade, pela literatura, pela educação e em relação à dificuldade, por conseguinte, de as pessoas elaborarem um raciocínio coerente, o sujeito dialoga com outros sujeitos, evoca outras vozes, traz à cena outros discursos. Embora não estejam explícitos, não parece custoso perceber ecoarem as vozes de segmentos sociais intelectualizados de nossa sociedade, tais como educadores (pedagogos e professores), filósofos, sociólogos, e psicólogos. Adiante, a autora recuperará a voz do professor, da perspectiva de um sujeito que é porta-voz da insatisfação desse profissional. O discurso da luta por melhores condições de trabalho, por melhores salários e formação adequada produzido por professores engajados, reunidos em sindicato, ecoa na voz do sujeito, que agora se posiciona do lugar social ocupado pelo professor. Esse sujeito situado assume a imagem do professor como o principal agente social que possibilitará a resistência às condições socio-culturais que mantêm os indivíduos na superficialidade, na vulgaridade, nas zonas de conformismo.
Cabe observar também que a autora, embora reconheça a dificuldade de resistir ao status quo (sempre vai existir uma elite intelectual) e proponha que ela seja estendida às camadas privadas dos bens culturais a que tem acesso essa elite, é incauta na avaliação que faz daqueles que se “comunicam com abreviaturas”. Possivelmente, se refere aos jovens que, nas interações on-line, se valem de formas abreviadas quando escrevem. O que ela não reconhece é que tais formas não constituem um empobrecimento linguístico, tampouco representam uma ameaça à integridade da língua. Tampouco é correto supor que os jovens possam  vir a transpor as formas que escrevem nestes espaços para outros gêneros textuais, como os que comumente são trabalhados na escola (como a redação escolar). A dificuldade que eles possam ter em expressar-se com clareza e coerência, em ocupar-se em conversas intelectualmente mais interessantes e edificantes, em se posicionar com argumentos sólidos e pertinentes não se deve ao fato de “escrever com abreviaturas”, mas ao fato de não dedicar à leitura um espaço de tempo maior em suas vidas.
Não podemos ignorar o fato de a autora sugerir a extensão da fruição dos bens culturais monopolizados por uma elite aos demais membros que se vêem privado desse privilégio. Claro é que estender esse privilégio é fazer desaparecer a noção de elite. Por definição, a elite é uma minoria dominante, cultural, política e economicamente. Não se trata de ampliar a elite, o que é um contra-senso, mas de diminuir as desigualdades, de trabalhar as contradições, um esforço contínuo de uma sociedade democrática, de modo a viabilizar o acesso dos excluídos aos bens culturais de prestígio (conhecimentos produzidos pela artes, filosofia, literatura, ciências).
Se nos detivermos na leitura dos dois últimos parágrafos (leia-os de novo), conseguiremos “ver” coisas interessantes aí. Atente-se para o enunciado: 
Sei que é uma visão catastrofista e que sempre haverá uma elite intelectual, mas o que deveríamos buscar é justamente a ampliação dessa elite para uma maioria intelectual.”

Ao empregar o verbo “saber”, a autora assume a proposição “é uma visão catastrofista” como factual. Mas ela o faz pressupondo a factualidade. Logo, o conteúdo “é uma visão catastrofista” é pressuposto como factual e, assim, ela se antecipa a uma possível imagem depreciativa que o leitor poderia fazer do momento prévio de seu discurso, já que está claro que ela vinha mostrando-lhe um cenário desalentador. Aqui ela também alerta o leitor para o fato de ela não aderir a uma visão utopista, idealista de mundo (ela reconhece, talvez, resignada, que sempre haverá uma elite intelectual). No que se segue “A palavra assusta, mas entenda-se como intelectual a atividade pensante, apenas isso, sem rebuscamento”, convém ver que o sujeito dialoga com o senso-comum, evoca-o, quando reconhece que a palavra intelectual assusta. Ou seja, há segmentos em nossa sociedade para quem a palavra intelectual é sinônimo de ‘vaidade’, ‘hermetismo’, ‘prolixidade’. A imagem do intelectual, nesse domínio discursivo, é a de uma pessoa que fala difícil, exibe conhecimentos que não compreendemos e está sempre disposto a criticar as tendências mais valorizadas ou os padrões aceitos. Atenta a isso, a autora, assumindo a forma de um sujeito que transita entre o discurso do senso-comum e da elite intelectual, esclarecerá, situada deste último lugar, que o intelectual é apenas aquele que se dedica à reflexão, às atividades do intelecto (analisa, ler, julga, escreve, enfim, pensa criticamente). Esse sujeito traz à baila outra imagem do intelectual, a que lhe parecerá mais adequada, porque não mais forjada no preconceito típico do senso-comum, e também a que atrairá, possivelmente, mais simpatia pelas camadas populares, uma imagem que deveria ser revestida por todos.
Claro está que as possibilidades de explorar os processos de significação do texto não se esgotam nessas reflexões. Há, certamente, muitos aspectos para serem considerados. O texto permite-nos múltiplos olhares. A leitura nunca é vedada, unifocal, mas plurifocal. Isso talvez iniba o professor ao trabalhar com a leitura. O trabalho com a leitura em sala de aula exige, evidentemente, competência por parte do professor, exige embasamento teórico-metodológico, exige que ele exiba uma formação sólida, mas também requer dele, principalmente, que seja um leitor, que tem de enfrentar suas próprias dificuldades quanto mais ler. Só se aprende a ler lendo cada vez mais.


Um comentário:

  1. é, pensar é para poucos.
    e pior q quem pensa criticamente está fadado a uma exclusão.
    mas-tu-tá-ligando?!
    eu não. :)

    aiai...

    isso aqui é um deleite!

    ResponderExcluir