domingo, 1 de julho de 2012

"O amor não cabe na palavra amor" (BAR)


Ao meu amor,







Assim se expressou Sponville, em seu Bom dia, angústia! (1997):





“As cartas de amor durarão mais tempo, muito amiúde, do que o amor. Elas sobreviverão a ele. Estarão ainda aqui, se se quiser, quando o amor estiver morto: atestarão o que tiver acontecido, o que eternamente continuará verdadeiro, mas que talvez, sem a escrita, teríamos esquecido ou perdido”.

(p. 39)



Perdi a conta das cartas que já compus, das que duraram mais que o amor. Cartas em que derramei minha alma, desnudei a emoção terna e fecunda do amor. Do amor primaveril, que se doa sem grandes consequências. Crescemos e desistimos de escrever cartas de amor. Elas testemunham uma ingenuidade que devemos superar, porque é parte de nosso crescimento. O amor da maturidade não se insufla de sonhos, mas ancora-se na solidez dos projetos. Todo amor aspira à eternidade, escrevi eu, certa vez; mas é necessário morrer. E nosso esforço é fazer com que a eternidade do amor caiba na finitude de nossa existência. Todo EU TE AMO, produzido na verdade de nosso coração, é um sopro de eternidade. Dizer EU TE AMO é a forma que encontramos para silenciar a angústia. Porque nada é eterno, nem mesmo o amor. Que se amem intensamente na brevidade da vida é o que desejam os amantes. Não nos cansamos de ouvir e dizer EU TE AMO; os apaixonados sabem disso. Querem ouvir todos os dias essa frase; querem pronunciá-la. Ao pronunciá-la, todos os dias, lembramos ao outro o compromisso; selamos nosso acordo. Por vezes, me esforcei por formular metáforas que captassem bem a densidade do amor que dediquei. Não careço mais delas, quando descubro que posso dizer alegremente EU TE AMO. Amor e reciprocidade são sinônimos; isso deveria ser evidente. Amor recíproco é redundância. Redundância do coração, que se doa, que se entrega, que se derrama. EU TE AMO, é o silêncio do amor que se impõe aos nossos corações. Isso é bastante, porque o amor é bastante.

4 comentários:

  1. meu namorado reclama de que, em toda carta minha, eu menciono 'apesares'; não costumo falar de futuros; tampouco de 'para sempres'.

    pergunto-me se uma carta de amor pode ser considerada como tal se for um pouco racional...
    :|

    beijos

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  2. Sempre gostei de escrever cartas de amor e de recebê-las. Confesso que tenho saudade dessa fase, instável do amor, é claro. As cartas tinham um teor promitente. Elas prometiam a eternidade inalcançável, intangível! Mas é nisso que reside seu propósito: a promesso do amor perene. Cartas de amor são para nós falarmos de amor. É para expressarmo-lo, sem mais. É uma boa pergunta a sua. Há espaço para o racional, digo, para ponderações "amadurecidas"? Creio que não, se levarmos em conta que nas cartas de amor não há espaço para o vislumbre da necesária finitude do amor. Nelas, o amor tem de ser, verbalmente, eternizado. Por isso, lembra Sponville, que elas duram mais que o amor que expressam. Seu destino é durar, é estar para além... eternidade de promessa, não de fato, é claro.

    Beijos!

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  3. é... preciso [re]aprender a compô-las.
    [mas o 'sincerismo' costuma ser pungente: não gosto de me iludir, nem iludir o outro. acho q elas - as cartas - têm de ser mesmo ridículas...]

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  4. Certo. Iludir-se jamais; iludir muito menos. Mas o rídiculo deve dar o tom à pena [ops! Anacronismo... à caneta].

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