Desesperadamente
Amemos!
Não sem cuidado
Pois
o amor dentre as coisas débeis
É
deveras a mais frágil
Amemos
como as crianças
Sem
saber por que ou para que
Amemos
sem razão e com gratuidade
Amemos
à proporção de nossa saudade
Daqueles
que jamais tornaremos a ver
Amemos
como se amanhã fôssemos morrer
Amemos
como se morre todos os dias
Amemos
porque uma vida sem amor
É
coisa terrível de suportar
Amemos
desesperadamente
O
desejo de amar
(BAR)
Os bastidores de uma prosa
amorosa
Deixa-me dizer-te
uma coisa. Não acredites em tudo que
escrevo; tão-só afia-te no que não consigo escrever, no que permanece no
silêncio que se ouve por detrás das minhas palavras, ou no interstício entre elas;
pois somente assim compreenderás que sou desmesura quando amo e que, quando não
amo, quase sempre, componho um canto suplicante de amor fremente. Se te
esforçares por auscultar o logos do
meu silêncio, saberás que sou amante das horas solitárias, das sutilezas, do
inapreensível e que, sendo eu indizível que se diz insistentemente, costumo dar
corpo a ilusões ordinárias.
Se
pretendes aprender alguma coisa com minhas palavras, ou mesmo se esperas delas
algum conforto ou alento, advirto-te de três coisas: que nada posso ensinar,
que minhas palavras podem até desesperar, e que nada delas é possível esperar
senão uma embriaguez de desalento.
Também
é imprudente pretender contemplar nelas alguma beleza que não seja a que se
deixa entrever, a que gosta de esconder-se. Se há uma beleza suscetível de ser
contemplada, nunca estará ela a descoberto. Sugiro que a procures no lugar
próprio do não-dito, ou nas regiões do inefável, ou ainda no domínio daquilo
que, se dizendo, se põe ao abrigo do silêncio inquisidor.
Por
fim, se esperas de mim um amor que te aguarda na ante-sala da prosa ou no
anfiteatro dos versos, desiste, pois que o amor que te devoto é amor de
bastidores, onde improvisamos nossa história de enlace, onde não ensaiamos
nosso romance, que é cotidianamente reinventado. O amor que te consagro é um
canto que se deixa sentir nos recônditos do silêncio das palavras que, a cada
vez enunciadas, inaugura o espetáculo do indizível.
Assim,
deve ser o amor nesse grande teatro que é a existência, onde o trágico e o
cômico se harmonizam para compor uma sonata candente: é esta um desejo de
silêncio amoroso imperturbável que dá corpo, gozo e fôlego ao indizível.
Canto de desmesura
Eu
canto a desmesura e nela repouso
A
minha voz que se veste do indizível
Meu
canto é um canto lírico de desgosto
Por
ver no amor a realização do impossível
Quando
amo sou excesso num instante
Sou
eu o indizível que se diz insistentemente
Quando
não amo entoo um canto suplicante
Que
se faz sentir de amor fremente
E
saberás, quando ouvi-lo, que sou amante
Das
horas solitárias, das noites tempestuosas
Que
dou corpo aos acenos intangíveis
De
uma alma desassossegada e desejante
Dos
encontros de dor, das ternuras amorosas
Que
se cantam em versos imperecíveis
(BAR)
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